A carreira de Sandy Leah sempre foi marcada por advérbios de negação. Quando a resposta não era “Não falo sobre minha vida pessoal” certamente passava por “Não, vocês estão viajando na maionese, nós nunca vamos nos separar”, mesmo que fosse tudo verdade.
No último CD da dupla, Sandy se negava a dizer SIM de qualquer jeito. Tinha até uma música em que reclamava aos quatro ventos: “Você não banca meu SIM”. Em outra canção, também revoltada, faz questão de que todo mundo saiba eu ela também ouve NÃO.
(Interessante perceber a horda de negatividade que permeia esse disco, aliás. Das 11 faixas - porque Último não conta, por favor – 7 delas tem a palavra “Não” em pleno refrão. Tá bom, parei, isso não tem nada a ver, rs!)
Nos últimos anos, logo depois de ter lançado o introspectivo Manuscrito, Sandy parece ter se arrependido da imagem melancólica, delicada e assustada que a persegue desde... bom, desde sempre. E assim o Brasil viu Sandy, “que sempre foi da turma do ‘talvez’”, assumir uma nova filosofia de vida, muito parecida com aquele do filme do Jim Carrey e se jogar “sem paraquedas no SIM”.
Propaganda da Devassa? “Sim”.
Apresentar UFC? “Sim”
É possível ter prazer anal? “Sim”
E embora nem todas as respostas tenham causado um efeito realmente positivo sobre sua imagem, vida e carreira, é com muito prazer muito bons olhos que recebo esse novo CD, intitulado SIM.
Como já comentei em outras ocasiões, a gente que está acostumado a escutar Leah desde sempre sabia muito bem que construir uma carreira numa vibe 100% Manuscrito não só era contra-produtivo, como injusto e irreal. Ela podia mais do que isso. A gente sabia. Só faltava Sandy se dar conta disso e dizer SIM pro mundo, pros sonhos, pro inexplicável. Agora não falta mais.
Segundo Sandy, a justificativa para a escolha do advérbio se deve ao fato de SIM trazer uma ideia boa, de positividade e otimismo. E como manda o figurino (um figurino até menos conservador, diga-se de passagem), Sandy, que não entrou nessa de cantar ontem, vestiu a carapuça do SIM, abraçou a causa e mostra um outro lado seu, menos intimista, mais descontraído, mais pop, porém igualmente encantador.
Desde o lançamento do EP, era visível essa mudança de perspectiva na sonoridade e de atitude de Sandoca. Além da tal mudança de postura, agora muito mais leve e alto-astral, presente não somente na belíssima faixa-título como em alguns versos da já conhecida “Escolho Você” e da inédita Ninguém é perfeito (mais sobre ela depois), outro tema permeia o novo álbum da cantora: o tempo. As principais faixas que exploram essa temática já tinham inclusive vindo a público em Princípios, Meios e Fins, que já comentei à época.
Mas, gostaria de comentar aqui primeiro o dilema que hoje vive Leah, que cresceu aos olhos do público e hoje seu repertório reflete muito dos versos de Aquela dos 30 em que ela se diz “jovem pra ser velha, e velha pra ser jovem”. Em SIM, convivem harmoniosamente, canções com letras divertidíssimas e joviais como Ponto Final (daqui a pouco eu comento sobre ela) e melodias complexas e maduras como Saudade. Essa disparidade na verdade só acrescenta ao disco e mostra a versatilidade da cantora, mas também causa empatia imediata por seu público que cresceu junto com ela e continua a se identificar com suas músicas, tornando-as trilhas sonoras de suas próprias vidas.
Falo isso por mim mesma que ouço Dona Sandy antes até de me entender por gente e hoje me encanto com a beleza de músicas antigas (porque elas eram sim, muito boas!) e me peguei adotando versos de Segredo, Escolho Você e Aquela dos 30 para explicar momentos que estou vivendo e agradecendo por Sandy, sem querer, ainda ter a sensibilidade de cantar a trilha da minha vida, mesmo sem fazer a mínima ideia do que se passa nela.
Ponto Final surpreende positivamente com letra divertida e afiada, além de bater o recorde de frases de efeitos por minuto. A performance animada no palco (porque com turnê estreando dois meses antes do disco, é claro que a gente já viu tudo no YouTube) com direito a megafone e tudo no final é de arrasar. Não via uma Sandy tão performática, abusada, engraçada no palco desde, desde, desde... Discutível Perfeição! E isso é ótimo!
Outra que flerta com os ditos populares é a perfeição em forma de pop Ninguém é Perfeito. A melodia solar, o refrão que gruda na cabeça, a sutil ironia na voz... Troco Olhos Meus por essa daqui fácil no show e já imagino a galera cantando a toda e apontando para Dona Leah: “Ninguém é Perfeito, mas você é a exceção que confirma a regra”. Queremos Ninguém é Perfeito no setlist JÁ!
Completam o disco a reciclada Refúgio, a belíssima Morada e a emocionante faixa-título SIM. Esta última, em especial, tem forte significado e, à medida em que a música cresce (o que é aquele piano no pré-refrão?), sobe também a vontade tomar as rédeas da própria vida, jogar fora os medos, os arrependimentos, as incertezas e dizer mais SIM também pra ver no que é que dá. A probabilidade de a vida se abrir é muito grande e acho que vale a pena arriscar um pouco mais. #SandyLiçãoDeVida
A única crítica fica por conta da economia na quantidade de canções, já que com 10 músicas não dá nem pra terminar de varrer a casa!
Houve um tempo (o tempo do vinil!) em que os discos só podiam ter no MÁXIMO 12 músicas, já que, ultrapassada essa quantidade, a qualidade sonora do álbum ficava comprometida. (Daí você tem histórias incríveis tipo o Zezé tendo que brigar pra colocar a então recém-composta, “É o Amor” num disco que já estava completo). Mas hoje já estamos em plena era digital, e a desculpa de que é melhor primar pela qualidade ao invés da quantidade não faz o menor sentido.
É CD, mas tem menos faixas do que o vinil
Dá muito bem pra fazer um disco de 12 faixas (por motivos que eu desconheço, o número padrão de faixas de um disco continua sendo 12. Com exceção das versões deluxe - ah, os deluxes! - que podem chegar a quase 20 faixas) muito bom e com a mesma qualidade (e agora eu não estou apenas falando da qualidade técnica do som) e tenho certeza que Dona Leah o faria se quisesse, porque talento ela tem de sobra e com um pouquinho mais de carinho, saíam e cabiam mais 2 músicas incríveis (porque ela pode e porque ela é) ali, SIM! Quem faz 10, faz 12, gente!
Aos que colocam a culpa na inspiração, sempre dou o exemplo dos autores, que produzem um trabalho tão artístico quanto e também precisam de dedicação e esforço para cumprirem seus prazos e entregar o trabalho pronto e bem feito. Se eles dependessem de inspiração, tão e somente, nenhum livro chegaria às prateleiras.
A discussão é boa, dá pano pra manga e na verdade já foi abordada aqui no blog em uma outra ocasião.
Só não misturem alhos com bugalhos. O disco está ruim? Claro que NÃO! Está incrível de bom! Podia ser mais e melhor? Com certeza SIM!
Sandy adota o lema da Perdigão pra sua vida e agora vai dizer SIM também pra mortadela, lasanha e pizza congelada.
A não ser que... Sandy, no fundo esteja numa campanha oculta pela eficiência do trabalho doméstico! Quer dizer, imagina só se todo mundo começa a arrumar muito mais rápido só pra não precisar trocar o disco? Agora eu entendi tudo! As 10 faixas são uma resposta à PEC das domésticas, pra diminuir o tempo do serviço e não ter que pagar hora extra!
Estamos de olho, hein, Dona Sandy!
PS. No início do texto, fiz algumas brincadeiras com o nome do CD e uma retrospectiva da carreira da cantora, comentando inclusive a canção do disco de 2006 “Você não banca meu SIM”. O que eu não esperava era que a música fosse tão profética. Porque com 10 músicas, sendo vendido a 25 reais, já tem fã cantando que Sandoca não banca o nosso SIM mesmo e só vai comprar quando o CD estiver 10 pratas na promo das Lojas Americanas. É, galera, não é só por 20 centavos...