Spoilers Mode ON
O primeiro volume da série Cabeça de Vento é um rom-com sci-fi teen salada, com alguns problemas de ritmo, algumas bizarrices, uma aura Disney Channel de ser, mas principalmente com uma mensagem bacana de valorização da beleza interior, e quebra de preconceitos contras os ricos e famosos.
O segundo, Sendo Nikki, que eu não resenhei por razões sei-lá (falta de tempo, falta de vontade, falta de assunto suficientes), é bem melhor do que o primeiro. A história, já com grande parte da premissa e dos personagens apresentados, ganha bom ritmo e fôlego, sem contar AQUELA cena com o Christopher que, OMG, talvez tenha sido uma das mais quentes entre os teens de Meg, afastando a série de vez da aura Disney Channel que havia apresentado no primeiro.
(Christopher, aliás, virou um dos meus mocinhos preferidos não por sua aparente perfeição, mas justamente pelo seu excesso de defeitos. Nesse último, Na Passarela, ele chega a dar nos nervos com suas neuras sem sentido. Mesmo assim, não consegui parar de adorá-lo por um segundo.)
Ainda sobre isso, outra coisa fica clara em Sendo Nikki: Tia Meg não tem o menor talento para seguir com triângulos amorosos. O que é ÓTIMO! Com tanta história boa para contar, não faz o menor sentido ficar perdendo tempo com uma mocinha em dúvida sobre com quem ela deve ficar no final. Meg é dessas que escolhe um lado. E vai te convencer a ficar do lado dela a qualquer custo. E fico feliz porque sempre escolho o lado certo. :-)
Entretanto no quesito subtexto, no segundo livro, Cabot dá um passo atrás ao novamente cair no estereótipo da modelo burra e sem coração, que havia ensaiado contestar no primeiro volume.
No terceiro e último volume da série,
Na Passarela, Meg coloca novamente as discussões sobre beleza no centro das atenções, e vai em direção oposta ao que eu achei que ela ia fazer lá no início, passando até por uma crítica ao feminismo radical. Uma pena o discurso ter se perdido um pouco no meio de uma crise de relacionamento entre
Em e Christopher, que acabou tornando-o um pouco confuso e controverso.
Em diversos momentos, a personagem parece passar justamente a mensagem oposta do famoso “a beleza interior é o que importa” e do girl empowerment, incentivando transformações de visual e joguinhos mentais com garotos.
No final das contas, o trauma com o assunto beleza que Em tem com a mãe deixa mais claro onde Meg queria chegar com essa história toda, que, eu vou arriscar, é uma campanha pelo direito de ser mulherzinha. Quer dizer, não há nada de errado em gostar de maquiagem ou pedir ajuda para um homem para trocar o pneu do carro. Isso não torna ninguém menos feminista. E tudo bem se a pessoa vive bem consigo mesma assim. Ser bonita não é só um estereótipo montado pela sociedade patriarcal, mas um estado de espírito e mais importante do que “ser bonita” é “se sentir bonita”, assim como prega aquela propaganda da Dove (eu só acho o seguinte: enquanto aquelas mulheres continuarem usando o shampoo da Dove, só com muita força de vontade mesmo).
Durante o irritante mimimi da crise de confiança do casal,
Em insiste em se comparar com Mary Jane e Lois Lane, quando está claro que nessa história ela não é a donzela em perigo, mas, tendo sofrido a transformação e estando no centro de todos os problemas,
Em está muito mais para Peter Parker ou Clark Kent. O próprio dilema de “pedir ou não ajuda”
é tipicamente heroico e não donzelesco.
Todos nós temos nossas fragilidades e futilidades. E chamar por socorro às vezes não nos torna mais fracas,
só mostra que somos humanas.
Só acho que, se era isso mesmo que ela queria passar com a série, podia ter sido mais enfática ou transmitido de um outro jeito. Porque por umas boas 100 páginas nesse mesmo volume, as mensagens que acabou passando foram outras que contradizem tudo o que sempre pregou em outras de suas obras, como se a própria autora é que tivesse sofrido o tal transplante de cérebro.
Como uma NY-fanática que sou, gostaria de destacar a importância da cidade como pano de fundo da história, o que já a torna mais interessante por natureza. E como brasileira que sou, gostaria de destacar também minha falta de fé na justiça contra os milionários, e por mais que eu tenha curtido o final com Robert Stark preso e tudo mais, duvido que ele tenha permanecido muito tempo na cadeia.
(Nossa, será que isso é um sinal de que estou ficando velha demais para infanto-juvenis? Ou será que a impunidade crônica do nosso país é que é a culpada por eu não acreditar nas prisões dos vilões nem na ficção?
Não é só pelos vinte centavos! É pela sensação de achar o final de um livro legal quando ele é legal mesmo, sem ficar pensando que o pior vai acontecer depois!!!!!)
Aliás, já que estamos falando de coisas implausíveis, foi difícil de engolir o Brandon assumindo a empresa do pai e fazê-la mais valiosa do que antes. Não duvido da capacidade administrativa do menino, mas cadê a credibilidade que ele passa para os acionistas? Quer dizer, é tipo o Eike deixar o grupo X nas mãos do Thor. Ninguém vai levar a sério. (Aliás, o
Thor é realmente diretor de alguma coisa nas empresas do pai. Não se sabia ainda de que ele era diretor, mas que ele tinha o cargo tinha. Agora me diz uma coisa: se ele não consegue dirigir nem o próprio carro, como é que vai dirigir uma empresa????)
Eu ia colocar uma foto do filho do Eike, mas achei melhor colocar uma do Chris, porque dá mais audiência ele é herói e tem mais a ver com a história
Mesmo com tudo isso, há de se destacar a capacidade narrativa de Cabot. Eu não conheço ninguém, eu disse NINGUÉM, capaz de transitar por entre gêneros tão bem e soar convincente e ainda fiel à própria identidade, mantendo o leitor interessado, virando páginas, com uma ação alucinante, sem esquecer o romance de deixar o coração na mão. O início de Na Passarela tem uma das melhores sequências de ação que eu já li. E o finalzinho, já no topo do prédio, com a bola de ano novo subindo é extremamente cinematográfico.
Com apenas 3 livros, Cabeça de Vento é acertadamente uma série curta. Sua premissa não permitiria que fosse muito além disso, o que não evitou que seu final ficasse um tiquinho corrido.
Incomoda um pouco a necessidade de Meg em acertar todo mundo antes da última página. Não deixa de ser bonitinho ela querer um final feliz para todos os seus personagens. Se você parar para analisar, ela faz isso sempre. E não é que eu não quisesse que eles também tivessem o seu final feliz, mas quando 3 desses casais se formam nas últimas 100 páginas da série, soa forçado demais.
Além do mais, a correria do final impede que vários dilemas surgidos do início (ou acrescentados nesse mesmo último livro) sejam amarrados de maneira mais elegante, como a gente sabe que a autora é capaz de fazer.
Cabeça de Vento é uma série que não faz feio, mas podia ser melhor. Com uma história rocambolesca (estilo novelas da Gloria Perez), Dona Meg, tal qual a autora brasileira, acaba se perdendo no meio da salada que criou e não consegue desenvolver bem alguns personagens nem discutir vários temas que sugeriu no decorrer da série (como o consumismo e a campanha da real beleza). Mesmo assim, no quesito entretenimento, é diversão garantida. Os personagens são carismáticos e o ritmo narrativo da autora continua impecável. Como leitura “cabeça”, infelizmente, a série tem mais “vento” do que deveria e Tia Meg podia caprichar um pouco mais no subtexto, que acabou até um pouco controverso.
E eu, que geralmente reclamo que tudo podia ser resolvido com algumas páginas a menos, acho que valia a pena fazer um último livro mais parrudinho, a fim de dar conta de tudo, com um pouco mais de calma. Afinal, a ditadura da magreza com os livros adolescentes já acabou faz tempo!
*Vale destacar que Adam Levine já terminou com a tal modelo, arranjou outra e agora INVENTOU um noivado (com outra modelo). Sinceramente, é mais fácil levar a sério o casamento do Naldo do que o noivado do Adam, numa boa.
PS2. Da série “Sorrisos Fora de Hora que Só eu Dou”, fica a passagem em que Em comenta o filme pra TV que eu havia falado na resenha de Cabeça de Vento e que já era um velho conhecido das páginas de DP2.