sexta-feira, 5 de junho de 2020

Teto para Dois e o bingo das romcoms

As pessoas costumam dizer que comédia romântica é um gênero previsível, porque basta seguir uma fórmula, e, voila, temos uma romcom de sucesso. Mas a verdade é que não é bem assim. Às vezes falta aquela...faísca que faz você verdadeiramente se apaixonar por aqueles personagens. E é difícil dizer às vezes o que separa as comédias românticas que fazem você realmente suspirar daquelas que são apenas agradáveis para um sábado chuvoso. Isso porque romcom é um negócio extremamente subjetivo.

Dito isso tudo, é preciso pontuar que, se fosse um Bingo, Teto para Dois marcaria todos os quadrados da cartela e ainda ganharia pontos extras trazer assuntos relevantes do seu tempo. Estão lá a mocinha comunicativa cheia de peculiaridades, o mocinho introvertido, a melhor amiga maluca, o casal de amigos sensatos, o melhor amigo divertido do mocinho, "figurantes" excêntricos que ganham nosso carinho no final e um grande gesto de declaração que parece tirado diretamente de Uma Linda Mulher*... Mas o mais importante é que tanto Tiffy quanto Leon têm tramas paralelas e algum conflito interno para resolver, e cujo o relacionamento dos dois vai ajudá-los a, ao longo do caminho, se tornar pessoas melhores.
** achei essa cena um pouco demais para o mocinho inclusive, mas, entendi o seu propósito.

Apesar disso, Teto para Dois subverte o meetcute (a cena só acontece beeeem pra frente e só ali temos uma descrição física dos protagonistas, o que achei bem esperto da escritora), e a cena clássica do "Só tem uma cama" (parece que todo o romance foi escrito a partir da ideia de subverter este clichê, aliás) e traz elementos que justificam uma das resenhas da contracapa do livro, que o classificou como “uma comédia romântica do século XXI". Um dos assuntos principais é a superação de um relacionamento abusivo (uma clara consequência do recente movimento do Me Too) e bem lá no fundo é possível inferir uma discussão sobre diversidade e racismo na trama do irmão preso, embora a autora nunca deixe isso explícito. Também interessante notar as escolhas feitas sobre o protagonista, que realmente parece refletir uma tendência para os romances modernos. Leon é um mocinho sensível e não idealizado. Bonito de um jeito casual, sem grandes posses, mas que também chora e sabe respeitar o espaço da protagonista.

Bingo, certo? Errado. Por alguma razão, Teto pra Dois não ganhou meu coração, e eu realmente não sei exatamente por quê.

Em determinado momento, lá pela metade do livro, senti que não havia conflitos suficientes, e as tramas paralelas soavam mais interessantes do que a do casal principal. Muitas vezes me perguntei qual a dificuldade dessas pessoas em utilizar o celular. Lá pela página 300, quando acontece a reviravolta que vai separar o casal principal (outro ponto clássico das romcoms), a impressão que fica é que a resolução era menos uma questão de "quando" eles vão se acertar, do que de "se", afinal, os dois moram juntos, têm amigos em comum, e a verdade certamente apareceria em algumas horas (nessas horas faz falta uma "cena do avião" pra dar uma emoção). Mas nenhum desses incômodos me irritou de maneira profunda, ou representam exatamente um defeito na história. Só que... sabe a faísca? Não rolou.

Talvez eu estivesse com expectativas demais. Talvez eu já tenha lido/visto comédias românticas demais. Talvez a escrita não tenha me conquistado por alguma razão... O que não quer dizer que não seja um livro agradável para um sábado chuvoso, ou que não vá funcionar com outra pessoa. Afinal, comédia romântica é um negócio extremamente subjetivo.

Ao me despedir do livro, terminamos nossa relação no melhor dos clichês do “Não é você, sou eu”, e apesar de tudo, desejo tudo de bom pra ele e pra autora e pra todo mundo envolvido. Espero que ganhe um filme, inclusive. Com os atores certos e um diretor bacana, pode elevar o material de uma comédia romântica B para alguma coisa bastante interessante. Durante a leitura, aliás, fiquei com a impressão de que essa história do casal que ocupa a mesma casa sem se ver, na verdade, de alguma forma, já filmada. Chama “A Casa do Lago” 😉 
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