sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Dever Cumprido

No outro post, descrevi um pouco o misto de sentimentos que ficaram guardados aqui dentro durante os últimos anos (o último ano principalmente). E pode ter parecido que foi tudo muito ruim. Mas não foi.

O que acontece é que em auditoria as coisas são todas muito superlativas (tão superlativas que até o superlativo é superlativo, rs!). As coisas boas são MUITO boas. E as coisas ruins são MUITO ruins. 

Cresce-se muito rápido (tanto profissional, quanto pessoalmente), e as promoções são constantes, e você aprende muita coisa, em muito pouco tempo. Você tem a oportunidade de ver como as coisas funcionam em diversos tipos de negócio e te dá uma visão muito mais ampla das operações. Enfim, é uma experiência que abre a cabeça total. Pra quem quer aprender, é a melhor coisa que tem.

Mas ao mesmo tempo em que te dá o mundo, também te tira em igual proporção. Coisas simples como saber onde você vai estar na próxima semana ou se você vai poder marcar uma viagem no feriado, e algumas noites de sono. Fora as outras coisas que eu já comentei no outro texto.

A decisão do que pesa mais varia de pessoa para pessoa e do momento de cada um. E é preciso respeitar a decisão tanto de quem sai, quanto de quem fica. Não existe caminho certo ou errado. E cada um sabe o que é melhor para si.

A bem da verdade eu acho até que fiquei tempo demais. Não imaginei que fosse agüentar tanto.

E fiquei porque, apesar de tudo, fui MUITO FELIZ.

De uma certa maneira, todo esse tempo que passei lá, muito se assemelha a minha trajetória no Cefet. Foram muitos perrengues, muita injustiça, muito esforço, mas também muito aprendizado, crescimento e amizades que vão ficar pra sempre no coração.

As pessoas que encontrei lá, aliás, foram uma grata surpresa. Graças a Deus só trabalhei com gente legal em todo esse tempo. Gente unida, engraçada, bacana e leal que fez os momentos difíceis suportáveis. Acho até que as adversidades forçam a gente a ser mais colaborativo, e não dão espaço para que surjam picuinhas sem sentido. Porque a gente tinha mais o que fazer do que se preocupar com essas bobagens. E ficava tão ferrado que a única saída era se ajudar e rir de si mesmos.

Tinha dias que eu não via meus pais e minha irmã, mas tinha passado o dia todo com eles. E aí acaba que essas pessoas se tornam um pouco a nossa família mesmo. (O que é engraçado porque, de brincadeira, a gente se trata tudo por “parentesco”. É “mãe” pra cá, “pai” pra lá, “tia” pra um lado, “irmã” pro outro...)

Acho que um dos segredos para as coisas darem certo nesse ramo está na própria contabilidade. Não na contagem, nos números em si. Mas em ter “com quem contar”. E graças a Deus, sempre tive gente em quem confiei, em quem me espelhei, gente para quem olhava e dizia: "Quando eu crescer, quero ser igual a você".

E quando pensei que estava sozinha, descobri que, na verdade, tinha muita gente cuidando de mim o tempo todo. Não tinha colegas de trabalho. Tinha "anjos da guarda". Não tinha "chefes". Tinha "pais" e "mães" com uma preocupação tão, mas tão grande que era uma relação quase maternal mesmo.

E já na fase do filho adolescente, era uma coisa de se amar e brigar, e dar conselhos, e demorar pra assimilar que o que estão te dizendo é só porque elas querem o melhor para você. E você achar que sabe tudo, e elas acharem que sabem tudo. E no final do dia, ninguém estava totalmente certo. (Diz se não é uma relação tipicamente familiar?)

Pra alguém que por muito tempo se fechou e afastou as pessoas, no meio do caminho chegar à conclusão do tamanho do carinho que tinham por você foi especialmente emocionante.

Na hora da saída, deu até dó de deixá-las pra trás. O coração apertou todinho. Mas o trabalho vai, e as pessoas ficam. E elas são especiais demais para sair da minha vida.

(E de fato não saíram! A gente está em contato direto!)

Contando para as pessoas

Quando tomei a decisão de aceitar a proposta do novo emprego, decidi que não ia contar pra ninguém antes do exame médico. E foi difícil à beça ter que me fazer de desentendida e não comentar nada, enquanto escutava os planejamentos para os próximos meses. 

Mas, antes disso, um dia minha melhor amiga por lá (ela tão amiga que acabou virando irmã – não falei que é tudo família?) acabou descobrindo por acaso. Ela estava praticamente virada por várias noites, e sensível, por conta da pressão do fechamento e das noites mal dormidas. Era de manhãzinha, e como a gente sempre fazia, mandava um “Bom dia!” no messenger da empresa, pra dar aquela animada. Segue a conversa, que foi mais ou menos assim:

Eu: Bom dia!!!
Maninha: Bom diaaaa!!!!
Maninha: Tenho uma boa notícia pra te dar. Vou sair da empresa semana que vem.
Eu: Que coincidência! Eu tb!!!
Maninha: O quê?????
Eu: É.
Maninha: Você tá de brincadeira, né?
Eu: Não.
Maninha: Porque eu falei de brincadeira. Diz que é brincadeira.
Eu: Não é.
Maninha: COMO ASSIM???
Eu: Caramba, pensei que você estivesse falando sério.
Eu: Peraí que eu preciso te ligar.

E foi bom eu ter contado, porque foi um alívio danado ter alguém pra desabafar até o Dia D (de Demissão!).

Pra falar a verdade, tinha uma outra pessoa que eu queria ter contado antes. Tinha dias que eu vinha tentando marcar pra gente se encontrar, mas estava difícil. Quando a gente finalmente conseguiu se ver, ela meio que já sabia. Como sempre soube o que estava acontecendo comigo antes mesmo de eu falar. Mas sabia também porque nos últimos tempos muitas coisas mudaram e a gente vinha se falando cada vez mais. Então, quando eu comecei com o papo de "A gente precisa conversar", assim do nada, e só pessoalmente, só podia ser sobre uma coisa.

E foi extremamente bonitinho como, na primeira tentativa de se falar, mesmo não podendo me ver, ela fez questão de ligar no dia seguinte pra saber se estava tudo bem (“Que que tu qué? – a delicadeza na nossa relação é algo tocante, haha) e como depois, no Dia D, quando eu precisei de alguém pra desabafar, ela fez questão de dizer: “Não se preocupa comigo. Eu vou estar feliz se você estiver” (Essa daí foi tocante de verdade). Nesse dia a gente ficou conversando sério no telefone até a meia-noite. Depois foram mais duas horas no telefone com a “Maninha” (sim, fiquei no tel até as 2h da manhã). Obviamente eu estava tão pilhada nesse dia que não consegui dormir.

O Dia D

Por muito tempo pensei em meter o pé na porta e pedir as contas de qualquer jeito, sem nada em perspectiva. Mas sabia que não ia ser a coisa certa. E que não iam me deixar ir embora assim tão fácil.

E mesmo com tudo encaminhado, olha, vou te dizer que só faltaram me amarrar, rs!
Por um lado foi um saco ter que ficar o dia todo na sala do sócio me explicando porque eu não queria mais ficar (e ele era bem insistente!). Pelo outro fiquei muito lisonjeada de causar toda essa comoção com a minha saída. E por mais difícil que tenha sido convencê-los que a minha decisão estava tomada e que o que eu queria para o futuro não poderia encontrar ali, também foi muito gratificante ter saído tão de bem com todo mundo, com as portas abertas, e recebendo um carinho tão grande de gente que eu não esperava, inclusive. 

Você sabe o que é uma das diretoras da empresa te ligar e, depois de você explicar seus motivos, escutar que ela se via muito em você e que, mesmo que você não queira voltar, você ainda pode ligar pra ela se precisar de qualquer coisa, que ela te arruma uma vaga em qualquer lugar? Pois é. Acho que eu fiz algumas coisas certas nesse tempo.

A despedida

E depois que contei para as pessoas, e pedi definitivamente a conta, me senti mais leve, afinal. E resolvi que iria viver aquela semana como se fosse a última. Até porque era a última mesmo.

E me permiti muitas coisas que estavam aqui dentro, mas nunca tinha tido a oportunidade de mostrar, de fazer, de dizer. Me permiti mandar emails bregas (meu email de despedida foi ÉPICO! Entrou pra história dos emails de despedida!), dizer mais "Eu te amo" para as pessoas que gosto e o quanto elas foram importantes pra mim, abraçar mais as pessoas, agradecer todo o carinho recebido e chorar (porque chorar faz bem!) enquanto fazia isso, ir de saia (só pra dizer que eu fui porque EU QUIS!), ir de jeans no último dia (só de revolta, porque o jeans sempre foi proibido), não levar as coisas tão a sério, estampar um sorriso no rosto que há muito não aparecia, cantar alto e dançar até o chão na despedida, escrever cartas multi-páginas com coisas diferentes para pessoas que me marcaram de forma diferente...

Durante a despedida, faltaram as palavras, mas sobrou cumplicidade no olhar. Os abraços, mais fortes do que nunca, diziam tanta coisa que não era preciso dizer mais nada. Mesmo assim, fiz força para colocar para fora aquele "Te amo" há muito guardado, entalado aqui na garganta. E melhor de tudo foi ouvir de volta um "Eu também" sincero e emocionado ao pé do ouvido, que também nunca tinha tido a oportunidade de ser dito.

Uma nova pessoa

Assim como no Cefet, tenho certeza de que entrei uma pessoa, e saio outra completamente diferente. Que todas as dificuldades no final me fizeram bem. E o saldo é muito positivo. Como muita gente gosta de falar, é realmente uma grande escola. Só que chega uma hora em que a gente precisa se formar.

Assim como no Cefet, eu também era muito boa naquilo. Só que sabia que no futuro, era algo que não ia me fazer feliz. E talvez alguns tenham ficado decepcionados com a minha escolha, achado um desperdício alguém com a minha capacidade, que tinha um futuro brilhante lá, escolher outro caminho menos "meteórico".

Mas acho que desperdício mesmo é ver a vida passar diante dos seus olhos. E se eu sou tão boa assim, as coisas vão acontecer de qualquer jeito. O futuro é imprevisível, como diria o Colin, do Teorema Katherine.

(E o engraçado é que durante esse mês de agosto, estava lendo outro livro do Green, Cidades de Papel, que não é tão legal quanto Katherines, se você quer saber a minha opinião. Mas parece também que foi o livro certo na hora certa, dada a filosofia de vida da Margo de não deixar para vida no futuro, e a passagem em que o Q descreve o sentimento de liberdade que é simplesmente "ir embora".)

Ao olhar para o prédio pela última vez, a sensação foi de dever cumprido. E dentre as múltiplas sensações que experimentei durante esse tempo, essa é uma das melhores que têm.

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