sábado, 9 de abril de 2011

Juliet, Nua e Crua

Quando eu terminei de ler Alta Fidelidade, fiquei me perguntando como seria a relação do Rob Flemming com a música em tempos de MP3. A resposta para minhas divagações/dúvidas veio com o lançamento de Juliet, Nua e Crua – o livro.

Nick Hornby retoma o assunto que o tornou famoso e adiciona a internet no meio (com direito a Wikipédia, email, fóruns de discussão e MP3*), atualizando o perfil dos aficionados e retratando com exatidão o comportamento dos fãs na grande rede.
*Ao contrário do que eu – e metade do mundo – pensava, tio Nick dá a entender que, apesar de ser um apreciador do vinil, sente um imenso prazer ao ver as faixas ganharem nomes automaticamente quando coloca um CD no player do computador e mais prazer ainda em organizar e nomeá-las quando isso não acontece.

E tem fã para todos os tipos. Estão lá: o fã-nático (que faz tour por lugares importantes na carreira do ídolo), o Stevie Wonder (que não consegue enxergar que a obra talvez não seja tão perfeita assim), o xiita (que encontra o texto na internet por acaso e arruma confusão), o Sherlock (que se considera estudioso e inventa teorias conspiratórias), o Seguidor (que pede pra tirar foto e depois ainda sobe pra internet), o novato, etc. Acho que só não teve fã-#hashtag porque o livro foi escrito numa era pré-sucesso-do-Twitter.

Duncan é um fã-nático/Stevie Wonder/Xiita/Sherlock e é dono de um site especializado no roqueiro Tucker Crowe. Em tempos mais remotos, o fã de um músico semi-famoso que abandonou a carreira há 20 anos sem dar explicação seria somente mais um admirador isolado pensando que só ele no mundo conhecia o trabalho de Tucker. Mas com a Internet (ah, a Internet!), de repente, ninguém está mais sozinho e esse punhado de aficionados sem noção espalhados pelo mundo afora pode se encontrar e debater e fazer amizades e inventar teorias malucas nos fóruns de discussão!

Não precisa nem dizer que eu me identifiquei totalmente com o Duncan. Viciada em fóruns que sou, conheço algumas teorias conspiratórias – e dependendo do assunto, até crio as minhas também -, já fiz planos mirabolantes desse tipo de tour (me falta o dinheiro, mas um dia eu ainda faço a minha excursão por NY – com direito a plantão no Central Park*) e vejo o povo sedento por lançamentos de novos materiais, mesmo que seja com conteúdo de coisas velhas. Também fico angustiada, louca para comentar alguma obra com alguém, e procurando mensagens subliminares nas coisas de que gosto.
*Agora não precisa mais de plantão no Central Park, né? *-*

É claro que todo esse fanatismo começa a incomodar Annie, a esposa de Duncan, que até gosta do álbum mais famoso e reverenciado de Tucker, Juliet*, mas depois de 15 anos, o relacionamento começa a dar sinais de desgaste.
* Eu sei que os estilos não têm nada a ver, mas lembrei da Jane, que deu goodbye pro Adam e  inspirou o 1º álbum do Maroon 5, Songs About Jane. #prontofalei.

A gota d’água acontece quando uma cópia de um novo álbum com versões inacabadas das canções de Juliet, intitulado Juliet, Nua e Crua, chega à caixa de correios do casal como cortesia da gravadora* (pois é, o Duncan também tinha parceria. E está aí mais uma prova de que elas não são de Deus). Annie, só de provocação, ouve o CD primeiro. E o pior de tudo: diz que não gostou!
*Um belo golpe da gravadora, diga-se de passagem, mas que para os fãs, isso não faz a menor diferença.

Duncan, obcecado que é, acha aquilo um absurdo. Como ela pôde ouvir antes? Como ela teve a AUDÁCIA de criticar essa nova obra-prima de seu ídolo Tucker Crowe? E após escutar o álbum por uma única vez, extasiado pela sensação de possuir o privilégio de ouvir aquela raridade antes de todo mundo, escreve uma resenha apaixonada – dizendo que a nova versão chega a superar inclusive o seu álbum favorito de todos os tempos, Juliet original (que depois de Nua e Crua, virou simplesmente Um, pros íntimos) - e publica na internet para delírio e inveja do resto da comunidade Tuckermaníaca.

Annie, revoltada, também escreve a sua – bem mais racional – e coloca na grande rede. O que ela não esperava era que fosse receber uma resposta de ninguém menos do que o próprio Tucker, que assina embaixo de tudo o que ela falou! (Olha aí a Internet fazendo a diferença de novo!).

O resto eu não posso contar, porque senão a leitura fica sem graça. Mas posso adiantar que o estilo Hornibyniano está de volta com os sorrisos de canto de boca e seus personagens imperfeitos e ainda assim carismáticos (destaque para os dançarinos da boate sem noção e o psiquiatra excêntrico), aliados às reflexões sobre a vida, relacionamentos e família.

Contudo, é interessante notar que apesar da tecnologia ter papel quase que fundamental no desenvolvimento na trama, Juliet, Nua e Crua é um livro sobre personagens que ficaram presos ao passado. Todos os três protagonistas sentem-se, de certo modo, tendo desperdiçado boa parte de suas vidas. A cidade pacata onde moram Annie e Duncan parece ter parado no tempo e é o exemplo perfeito da ausência de progresso. E a protagonista, inclusive, trabalha num museu (uma ótima sacada do Tio Nick!).

Juliet, Nua e Crua tem um certo quê de comedia romântica, mas sem o final arrebatador (e eu nem senti falta disso). Porque, tal qual Alta Fidelidade, antes de tudo, ele é um livro sobre a relação das pessoas com a música, a relação das pessoas umas com as outras, e a relação das pessoas umas com as outras quando a música E a internet (a novidade de Juliet sobre seu "antecessor") estão no meio.

Certamente é uma leitura obrigatória para quem é fã, principalmente para aqueles que às vezes se esquecem que seus ídolos não são unanimidade, ao mostrar que, da mesma forma que essas criaturas obcecadas - apesar de não parecer- também têm vida (igual a todo mundo), aqueles os quais tanto admiramos também só são mais alguém tentando encontrar a sua própria estrada pra trilhar.

E em tempos de Internet, onde estamos todos navegando no mesmo barco tripulado por gente de todos os tipos e gostos, Hornby não poderia ser tão certeiro.

PS1. Olha só que legal que eu acabei de achar. Isso porque foi sem querer. Porque quando o fã obcecado quer, ele descobre muito mais...
PS2. Chega a ser engraçado ver o verbete de Juliet, Naked - o livro - na Wiki, depois de ter lido o de Juliet, Naked - o disco - no livro.
PS3. Próxima parada: Um Grande Garoto!

Edit: Comentei ali sobre a semelhança de Juliet e Jane, certo? 1 ano depois da resenha, o M5 lançou uma versão comemorativa de 10 anos do Songs About Jane, no estilo Juliet Nua e Crua. Sou profeta! Agora imagina que louco a namorada de um fã do Maroon 5 escrever uma resenha falando mal do "novo" álbum e acabar tendo um caso com o Adam Levine?

3 comentários:

  1. Ooooooohhh! Elisa fez um post relativamente curto! Está doente? Hahahah

    Aquele "Alta Fidelidade" não chamou nem um pingo da minha atenção mas esse me deu vontade. Será que é por causa da internet no meio?
    Que história diferente! O marido e a mulher brigando por causa de fanatismo kkkkk
    O mais incrível que achei foi o tal cantor concordar com a resenha negativa, aí que a confusão está formada o.O

    Bacana o título do livro e a capa também.
    Gostei da resenha ^^

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  2. Sei que nunca comentei em uma resenha sua, mas adoro elas! Adoro seu blog, né, já disse.

    Então... Se o livro fala sobre fanatismo e internet, quero! E, quer dizer, fala sobre bem mais que isso, como você disse... Mas em geral gosto de livros que abordam a internet.

    Nunca li nada desse autor, mas é claro que fui pesquisá-lo e daí me lembrei que já tinha lido sobre. E também vi vários, mas vários livros dele disponíveis por um preço legal na Livraria Cultura, inclusive esse, então... Preciso parar de ler YA mesmo hahaha

    Beijo!

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  3. Não tinha lido essa resenha ainda. Fiquei com preguiça no dia, confesso.

    Quando você postou sobre Alta Fidelidade, eu não fiquei muito entusiasmada pra conhecer o autor. Mas esse pareceu muito bom, já vou pesquisar um pouco sobre ele.

    Um Grande Garoto é um que tem filme, não é? Acho que já assisti uns pedaços, mas o enredo não me chamou muito a atenção.

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