terça-feira, 28 de agosto de 2012

Take a sad song and make it better

Tem histórias que são tão boas que se melhorar, estragam. Tem outras que são tão ruins que nada consegue salvá-las. Enquanto lia Lonely Hearts Club, a sensação que tive não foi nem uma, nem outra.

Depois de ter encarado um livro extremamente melodramático e incrivelmente pretensioso, resolvi que precisava de uma leitura bem light para elevar o espírito e, após ler inúmeras recomendações desse que fazia alusão aos Beatles (muitas delas o comparavam a minha ídola-mor Meg Cabot), comprei-o numa promoção da internet.

Mas, para qual não foi a minha surpresa quando abri o pacote da Siciliano (na verdade o pacote era da Saraiva, apesar de eu ter comprado na Siciliano. E tudo bem que elas são do mesmo grupo, mas, pelo visto, o princípio da entidade por lá é zero! Medo da contabilidade desses caras!) e verifiquei que Lonely Hearts Club possui em sua capa uma citação-propaganda de ninguém menos do que Stephenie Meyer, a autora do livro que eu mais odiei na vida!!!! Aquilo não podia ser bom sinal, pensei eu. No entanto, comecei a leitura de peito aberto, certa de que o nome da mulher que cometeu Crepúsculo na capa era apenas uma estratégia de marketing barata e que ela nada tinha a ver com esse livro (mais tarde fui descobrir nos agradecimentos que ela é amiga pessoal da autora mesmo, o que certamente deve tê-la ajudado no processo de publicação).

Elizabeth Eulberg ainda tem que comer muito feijão com arroz pra ser Meg Cabot. Mas, felizmente, também precisa se empaturrar de jiló com quiabo para ser Stephenie Meyer. Ele pode não ter me feito rir como um autêntico cabotiano, mas nem de longe fiquei com vontade de jogar o livro na parede como a criadora dos vampiros brilhantes conseguiu. Para falar a verdade, o livro não me irritou nem um pouco, e eu me diverti bastante. A pena é que foi pelos motivos errados, rs!

Lonely Hearts Club sem dúvidas tem o apelo adolescente de Cabot - com todo o universo high school de líderes de torcida, atletas e olhares afetados no refeitório – assim como a mensagem de amizade, auto-estima e feminismo. Mas, infelizmente, o livro também comete os mesmos pecados de Meyer ao apresentar descrições fracas, personagens vazios e não possuir um conflito verdadeiramente empolgante. Este último, aliás, é um dos aspectos mais decepcionantes da história, que tinha um enorme potencial, mas que fica prejudicada por uma série de escolhas por caminhos de fácil resolução. A falta de inventividade da autora e o desperdício de tramas e piadas prontas chegam a ser antiecológicos e incompatíveis com a filosofia sustentável em voga.

Para começo de conversa, a Beatlemania foi muito pouco aproveitada. As referências aos garotos de Liverpool se limitam a trechos de canções no início de cada grupo de capítulos (quando poderiam facilmente iniciar todos eles) e pequenos momentos em que as músicas são jogadas em cena de maneira pouco orgânica (quando poderia ser criada uma história que traçasse um bom paralelo com a carreira do grupo que, dizem os fãs, se desmantelou por culpa da vida amorosa de um de seus integrantes), só pra dar um exemplo.

Os roqueiros se divertem

Por outro lado, a própria escolha por homenagear logo os Beatles, dentre todas as outras bandas, já dificulta a criação de alguma dinâmica interessante. Os Beatles, ao contrário dos Stones, eram os certinhos do rock, todo mundo gostava (e gosta) deles, as mina pirava quando via os garotos. E até hoje são meio unanimidade. Não tem nem graça, nem motivo pra implicar com eles. E por mais clássicas que sejam suas canções, em certos momentos, eles parecem deslocados ali, no meio de adolescentes dos anos 2000 que agora gritam é por Justin Bieber e afins.

Fica difícil até de saber se o livro faria mais sucesso entre meninas de até 15 anos, já que Beatles não é algo que geralmente freqüente o player desse público. Isso não quer dizer que elas sejam descerebradas, nem nada. É só que com 12 anos a gente tende a preferir outro tipo de música que não discos lançados há mais tempo do que a nossa idade, nosso conhecimento de mundo ainda é muito restrito e dependendo do grau de alienação da pessoa, pode ser que ela nunca tenha ouvido falar em Beatles.

Mesmo assim, a autora podia brincar com isso, fazendo a garota ser a única pessoa do mundo que odeia os Beatles por ter nome de uma música deles. E até a escolha da alcunha da protagonista foi equivocada, já que Penny Lane não é nem de longe tão conhecida (e tão legal) quanto Hey Jude. Nem ao menos uma das irmãs dela se chama Judy também, aliás! Sério, gente, até o Doug tem uma irmã chamada Judy por causa dos Fab Four!

Aos desavisados, Jude era homem
E esta aí mais um motivo para a menina odiar o próprio nome e incluir uma ou duas linhas sobre a história dos Beatles!

Só para pra concluir o festival de piadas prontas jogadas no lixo, também acho que dava pra desenvolver melhor os personagens dos pais, que podiam ser muito mais excêntricos. A campainha tocando Love Me Do, a família que tira várias fotos na Abbey Road e a parte em que eles completam um dos diálogos com Yesterday foram ótimas sacadas, mas dava pra fazer mais! 

O consultório de dentista do cara podia ser todo decorado com Beatles, ou dar de brinde para a irmãzinha do Ryan um Yellow Submarine (aliás, completamente dispensável a cena da irmã do Ryan se machucando!). A autora podia ter transformado esses diálogos-que-viram-música em piada recorrente e acrescentado alguma cena de choro de Penny Lane (que mais do que nunca devia se chamar Judy!!!!!) seguida de um consolo e conselhos de sabedoria tirados dos Beatles dados pelos progenitores sem noção (essa cena, claro, seria ao som dos versos “Hey Jude”)... E eu nem me esforcei muito pra pensar nisso!

Aliás, Doug tinha uma banda chamada The Beets e seu hit, Killer Tofu!

Ao invés de aproveitar o trunfo que tinha nas mãos, ela preferiu focar em dramas bobos e infantis que não duravam nem 30 páginas. A ideia de um clube anti-garotos parece muito mais legal e coerente em Os Batutinhas (no caso era um clube anti-garotas, mas enfim), que de quebra tem um time de crianças fofas, o cabelo do Alfafa-que-em-algumas-dublagens-é-Espeto, a cena do festival de talentos e o final super emocionante com aquela corrida. Mas o pior de tudo é que ela logo é desmanchada, acabando com qualquer chance de conflito. Alguns “mimimis” acontecem, mas se resolvem fácil demais, e o maior obstáculo da história é de uma incoerência sem tamanho. O diretor da escola se incomodar com um clube de meninas a ponto de chamar os pais e suspender uma aluna? SÉRIO???? Em que ano nós estamos, 1950?

Ah, sim, claro, esqueci de mencionar que o colégio em que se passa todo o “drama” é o McKinley. O mesmo de Glee. (E aí cabia ainda mais uma piada da professora das líderes de torcida, essa sim, tentar acabar com o Hearts Club!)

Não é Beatles, mas o negócio é que eu adoro essa música! E a letra encaixa direitinho com a história do livro.
(Eu também prefiro a versão da Kelly Clarkson, aliás! Sério, gente! Essa música dá muita vontade de ser feliz!)

Lonely Hearts Club é “stand alone” e, ainda bem, não tem continuações em vista. Mas apesar disso tudo, ainda acho que dava um bom seriado. Ou um filme estilo Sessão da Tarde. E é claro que já compraram os direitos para produzi-lo. Não sei a quantas anda o projeto, mas os Beatles são cheios de frescura com direitos autorais de suas músicas, então, pode ser que o negócio fique caro demais e não saia do papel. Vamos acompanhar.

Só pra terminar, a tradução é estilo Ana Banana, com homens que respondem “obrigada” e personagens que parecem falar português. Se é pra abrasileirar, podia ter traduzido logo o nome da garota pra Ana Júlia de uma vez (aliás, essa ia ser uma versão brasileira dessa história seria ótima ideia!).

A impressão que fica é que Lonely Heart Club não é ruim. Mas podia ser muito melhor. Fazer o quê, se quem estava por trás de tudo era Stephenie Meyer? Com uma mentora dessas, era melhor não ter ajuda de ninguém.

Mas qualquer dia desses eu vou dar um jeito nessa história com o Bloco do Eu Sozinho. Me aguardem.

Também não é Beatles, mas pelo menos a música é deles agora.

4 comentários:

  1. Lisa, você leu o que se passou pela minha cabeça quando terminei de ler, acrescentou aquelas piadinhas que só você sabe fazer e escreveu a resenha. Sério, eu não poderia concordar mais. Li o livro inteiro em um dia e até me diverti durante a leitura, mas foi só isso. Tanto que eu nem fiz resenha e dei meu livro pra irmã do meu cunhado.

    Seria, mesmo, bem mais engraçado se o nome dela fosse Judy. Nossa, até eu - que não sou muito boa nisso - já pensei em várias coisas legais. O livro já começaria com alguém chamando a menina com um "Ei, Judy!".

    Mas o que eu não gostei mesmo foi da construção dos personagens. A relação Penny/Ryan é totalmente artificial. Num momento, ele parece ser apenas "o cara bonito que namora a menina gostosa"; na página seguinte, ele praticamente assume o papel de "melhor amigo apaixonado" :S

    Tomara que a autora continue tendo ideias legais e que melhore em seus próximos livros, caso existam. Talvez, se não fosse pela possível intervenção da Meyer, ela não teria sido publicada e teria aprimorado um pouco mais a história...

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    1. Oi Cíntia! Como vc bem definiu, a culpa é toda da Stephenie Meyer, rs! Quando eu digo que essa mulher é um carma na literatura, ninguém acredita. Nada do que surgiu no mundo dos livros por causa dela foi coisa boa!!!!! Hehehe!

      A relação da Penny com o Ryan é bastante artificial, mas qual relação nesse livro não era? E aquele bando de meninas sem personalidade que participam do clube?

      Mas acho que o que matou de vez o romance dos dois foi que o clube apoiou o tempo todo, a ex-namorada nem ligou, e aquela cena da irmãzinha dela, que teoricamente era para humanizar o personagem (pra quê isso, meu Deus? A gente já tinha sacado que ele era do bem!) ficou muito forçada. Enfim, milhões de coisas que poderiam ter acontecido e ficaram pelo caminho.

      Com um pouquinho mais de desenvolvimento, o livro poderia ter sido muito mais legal. Mas quem tem Meyer como mentora, é melhor não ter ninguém.

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  2. Queria fazer um comentário elaborado, mas a verdade é que já esqueci a maior parte do livro, então fica difícil concordar ou discordar (dessa parte do diretor da escola chamar os pais, por exemplo, não me lembrava mais e achei bem nada a ver agora).

    Pra mim, foi um livro excelente pra desestressar. Posso não lembrar muito da história, mas lembro que li logo depois de um Guimarães Rosa pro vestibular, que foi bem cansativo (inesquecíveis traumas de vestibulanda). Então, sim, ele é bem estilo sessão da tarde e, naquele momento, gostei muito.

    Acho que a questão das piadas desperdiçadas tem mais a ver com a intenção e o tipo de escrita da autora. Eu preferiria mais alusões aos Beatles (e as piadinhas), mas acho que ela queria atingir bem esse público mais adolescente, que, mesmo não gostando de Beatles (e desconhecendo, talvez? Existem, de verdade, pessoas que não sabem quem eles são?), seria atraído pela parte drama-high-school.

    Eu até pensei em dizer que talvez esses dramas adolescentes estejam me atraindo cada vez menos porque estou passando da idade, mas aí lembrei do quanto gostei de A Culpa é das Estrelas ou The Scorpio Races - que li há alguns meses - e acho que tem mais a ver com histórias pouco inspiradas mesmo. De qualquer jeito, digo de novo: quando li o livro, em 2010, gostei bastante. Não sei dizer se hoje seria a mesma coisa, mas tenho quase certeza de que não.

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    1. Fê, às vezes eu pego um YA genérico desses e fico com a sensação de que eu é que não sou mais o público alvo também. Mas aí eu lembro de outros livros voltados para o mesmo público que são tão legais e chego à conclusão de que o problema é que a história é que não é boa mesmo. O que não quer dizer que não tenha casos de realmente eu admitir que o problema é que eu estou ficando velha e que se eu tivesse alguns anos a menos iria curtir muito mais.

      Nessa caso, acho de que o problema foi a história. Fico imaginando o que não seria dela nas mãos de uma Meg Cabot, por exemplo. É certeza de que o desenvolvimento dos personagens, dos dramas e até das piadinhas envolvendo Beatles iam ser melhores. Não duvido nada que existam pessoas que não saibam quem foram os Beatles, e por isso me pergunto se o livro teria mais apelo para meninas mais novas do que para um público menos teen. Porque a parte do drama high school é muito mal aproveitada e não convence ninguém com mais de 15 anos.

      Mas eu me diverti com o livro! Escalei meu elenco mentalmente e elaborei toda a trama de uma versão brasileira da história! Eu só queria tem divertido mais por razões intencionais do próprio texto.

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